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quinta-feira, 25 de abril de 2013

Ngc 2808 - Tropeçando em Estrelas




 Às vezes a gente atira no que vê e acerta no que não vê.
Com a lua quase cheia eu não tinha nenhuma pretensão. E assim soltei o parafuso que prende o Motor drive ao eixo de R.A. do “Newton” ( refletor 150 mm) .  Sem nada em mente aponto para aquela região que é meio Centauro, meio Carina. A área é tão rica que costumo nem utilizar a buscadora. Eu calço a 25 mm no porta ocular e fico brincando com os comandos lentos para lá e para cá até esbarrar em algo.
Provavelmente por uma razão geográfica a primeira vitima é quase sempre IC 2602. As Plêiades do Sul. Estas eu gosto mais de observar de binóculo. É um daqueles casos onde não se vê a floresta pelas arvores. E cobrindo uma área de quase duas luas cheias é muito para minhas modestas oculares.
E a partir daí é só seguir a maré. É curioso como se percebe o disco galáctico. Conforme você brinca com o comando do eixo de declinação você percebe claramente que você passa por uma área de uma densidade estelar maior e aí ela diminui. Balança para o outro lado e idem.  É o disco Galáctico. Ou o braços da galáxia. Ou a Via Láctea. Chame como quiser...
Com o “Newton” girando para lá e ara cá, que nem uma baiana em desfile de Carnaval, vou esbarrando nos diversos aglomerados abertos que habitam os braços do tal disco galáctico.
Ngc 3766, 3532, 3114, 3293, 3324. Não posso esquecer de Eta Carina e sua nebulosa. Mas esta sofre muito com a Lua cheia. 
E no balanço resolvo fugir um pouco da rodovia galáctica e começo a passear nas cercanias do disco. E logo esbarro em algo que não conheço. Um globular. E ainda próximo  daquele carnaval de abertos na estrada principal ele salta aos olhos. Com certeza eu nunca o tinha visitado. Paro tudo e tento me localizar. O globular esta próximo de Miaplacidus (Beta Carina). Avalio a posição para posteriormente descobrir quem é a criatura.
Como não pretendia fotografar o alinhamento polar tinha sido feito de uma forma bastante aproximada. Melhor dizendo não tinha sido feito. Mas eu percebera que apesar disto eu estava acompanhando tudo que caia na minha frente utilizando somente uma mão.
-Ohhh sorte!!! Penso comigo.
E assim antes de correr para o computador para baixar a ficha do elemento eu resolvo arriscar umas fotos. 
Definitivamente o alinhamento polar “tabajara” estava bem aceitável. Aqui em casa ele dificilmente fica melhor que isto. Como já falei, recentemente,  a área junto ao polo tem-se encontrada envolta em bruma e com a lua cheia os tímidos habitantes da região estavam todos bem escondidos. Confesso que nem tentei...
Tirei 20 fotos e depois fiz 10 Dark frames.
De volta a pesquisa descubro rapidamente o nome do bruto. Ngc 2808.  Não há muito globulares na região e o trabalho foi fácil.
O globular é bem brilhante e levemente alongado. Não resolvo nenhuma estrela. Não espere isto  a menos que você possua pelo menos 400 mm de diâmetro. O aglomerado se classifica na classe 1 da escala Shapley- Sawyer de concentração. A escala vai de 1 a 12 . 1 é o Maximo de compressão e 12 o mínimo.  Vocês verão uma condensação de luz bem brilhante... Em um campo com algumas estrelas.
Apresento alguma fotos com diferentes tratamentos. Todas se apresentam bem lavadas. A Lua...

O modo “sort” do Rot n´Stack é um sempre me lembra da palavra pirotecnia. Mas no caso aqui ele serve para apresentar claramente quão concentrado é 2808. E o único que resolve algumas estrela em suas bordas.
17 exp. X 15 seg. Rot n´Stack  em " sort mode".

As demais fotos são bastante semelhantes ao que você observará junto a sua ocular.
17 x 15 seg. Modo mean. ASA 3200 Canon T3

1 Exposição de 15 seg. ASA 3200

O Deep Sky Stacker ,em seu já tradicional mau humor, só aceita 4 das fotos . E ainda deixa a imagem extremamente vinhetada. Mas ele é mais poderoso queo o RnS e acredito ver um pouco mais de detalhe no globular. Pode ser só vontade...
Esta foto percorreu um longo caminho... começou com 17 frames dos quais o DSS escolheu 4...
Depois visitou o Iris, o Photoshop e o Noiseware. Acho que cansou...

Localizar Ngc2808 não é difícil. Ele é bem brilhante e será percebido pela buscadora. Um bom ponto de partida é Miaplacidus ( Beta Carina). Eu tropecei nele...


Foi descoberto por James Dunlop com um refletor de 225 mm. Em 1826. Historicamente é um DSO bastante jovem. Cosmologicamente ele é tão antigo como podem ser a as coisas no universo.Algo em volta de 12,5 bilhões de anos.
Ngc 2808 é um globular com características bem especiais.  Em 2007 um time liderado por Gianpaolo Piotto , na Universidade de Pádua , utilizou imagens do Hubble realizadas entre 2005 e 2006 e descobriu fatos inesperados. A maioria dos globulares possuem apenas uma geração de estrelas. A razão disto é que esta primeira geração geraria forte radiação e nesta “ventania atômica” o gá residual seria perdido. Sem gás, sem estrelas. Simples.
Mas Ngc2808 possui três gerações estelares , todas nascidas em um espaço de 200 milhões de anos a partir de sua formação.
Mas como o dito globular é um dos mais maciços conhecidos foi elaborada a hipótese de que sua grande massa tenha sido suficiente para que ele ,gravitacionalmente , apresentasse uma contra partida para perda gasosa.
Outra hipótese é que ele seja o resultado de uma galáxia anã que chocou se com a Via láctea.  

terça-feira, 23 de abril de 2013

Ngc 5281- Um Sorriso Misterioso


          
 
          Tenho estado a passear ao redor de Alpha e Beta Centauro quase diariamente. Sua posição é favorável para a limitada área de visibilidade permitida no “Stonehenge dos Pobres”.
            Logo ao início da noite a posição dos “apontadores do Cruzeiro” é favorável e como que por milagre meus vizinhos não estão com as luzes todas acesas. Desta forma consigo rapidamente realizar um alinhamento polar no limite do aceitável e ter minha buscadora afinada.
            O outono tem sido ingrato para o alinhamento polar no Rio de Janeiro. Mesmo com o céu limpo há muita nebulosidade até bem alto no horizonte. E assim a região do polo celeste se encontra sempre muito apagada. Tenho que “ralar um dobrado” para localizar Sigma Octans e assim poder fazer um alinhamento que vá um pouco além de um sentimento...
            Parto de Hadar (Beta Cen) e tentando acertar minhas contas com Ngc 5316 eu acabo encontrando um dos poucos objetos Lacaille que nunca tinha observado.
            O Abade Nicolas Louis De Lacaille (1713-1762) descobriu o meu convidado esta noite durante seu levantamento realizado no Cabo da Boa Esperança, África do Sul, realizado entre 9 de abril de 1951 e 8 de Março de 1753. Equipado com um modestíssimo telescópio de 12,5 mm F/50 (isto mesmo...) ele percebeu Ngc 5381 como um “pequeno e confuso local”.
            Ele o inclui em seu catalogo como Lac I. 7.
            É curiosa sua inclusão na categoria I de sua classificação. Nébula sem estrelas.
            É curioso porque mesmo pela minha buscadora eu percebo o aglomerado como uma brilhante estrela um pouco alongada. Algo como uma estrela dupla no limiar da separação. Com pouco esforço percebo três estrelas levemente curvadas. Como em um sorriso. O´Meara, em seu “Hidden Treasures”, destaca que Ngc 5316 que se encontra a 20´a nordeste de 5281 é um aglomerado muito maior e de magnitude semelhante e não se resolve em sua buscadora (na verdade em uma antiga luneta) e que pela descrição de Lacaille em seu trabalho” Sobre nebulosas do Céu Austral” ele certamente não os confundiu.
            Lacaille descreve a categoria I de sua classificação assim: “nada mais que áreas indefinidas, esbranquiçadas, mais ou menos luminosas e de formato irregular: estas regiões são muito semelhantes ao núcleo de um tênue cometa sem cauda”.
(Memoires de l’Academie Royale des Sciences1755)
             Descrição não deixa duvidas e é bem representativa do que percebo pela minha buscadora em uma primeira impressão.
            Em céus bem escuros Ngc 5281 vai se apresentar como uma estrela no limiar da percepção (6ª magnitude) para o olho humano.


5 exposições x 20 seg. 1600 asa  empilhadas no Rot n´ Stack. Perceba HR 5171 abaixo e a esquerda do Aglomerado.  


            Observando com o “Newton” (um refletor de 150 mm) com um ocular de 25 mm eu tenho aumento de 48 X. E assim 5281 se apresenta pequeno e gracioso. Um arco de estrela coloridas, que vão desde o branco até um vermelho bem vivo adorna sua “barra” central e algumas outras estrelas ainda mais fracas emolduram o conjunto. As condições da observação não são ideais e acredito que resolva ainda mais estrelas em céus mais dignos. Mas o pequeno aglomerado é uma grata surpresa e apresenta um colorido muito interessante. Não sei por que me recordei do Gato de Chesire. Como disse Alice: - Eu já vi gatos sem um sorriso, mas nunca um sorriso sem um gato... Ngc 5281 é mesmo uma maravilha.

            Encontrar Ngc 5281 não é difícil. Partindo de Beta Centauro localize HIP 68191. É uma estrela evidente e que vai aparecer claramente no mesmo campo da buscadora com Beta centauro bem no canto. (Buscadora 8x50 mm com um campo de cerca de 5º). Com esta centralizada 5281 vai estar em quadro. Em condições muito extremas de poluição luminosa coloque sua maior ocular e procure pelo aglomerado partindo de HIP 68191. Com a 25 mm calçada no meu telescópio o aglomerado se encontra a pouco mais de um campo ocular da estrela. Com magnitude 5.9 o aglomerado é bastante obvio embora pequeno ( 14´). Apesar de se encontrar em campo rico o aglomerado vai chamar sua atenção.
Outra referência é uma estrela bem vermelha que se encontra na região. Responde por BSC HR5171 ou V0766 Centauri e só é identificada no Cartes du Ciel.  Sua cor me chamou a atenção e brilhando com 6ª magnitude é um excelente farol. Trata-se de uma supergigante vermelha e já vai adiantada rumo a seu fim...
Ngc 5281 é um aglomerado jovem. Sua idade é estimada em 45 milhões de anos.
É um aglomerado pouco estudado e não consegui descobrir a distancia e nem  outras informações sobre o aglomerado.
Um sorriso misterioso...

P.S. Uma nova foto de Ngc5281. Desta vez com um acompanhamento polar mais digno.


.1 exposições de 15 segundos ASA 3200 . Deep Sky Stacker e Photoshop CS5


É interessante perceber a diferença entre a primeira e a segunda imagem. A primeira foi feita cm um refrefrator de 70 mm ,o Galileu,  e a segunda realizada com o ""Newton" . Um refletor de 150 mm. 

 


           

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Uma Comédia de Erros e Ilustres Desconhecidos


         
         Sempre estou tentando descobrir um jeito que me permita realizar um alinhamento polar digno e mesmo assim não ter que realizar o método do “Drift”. Afinal métodos de confirmada eficiência nunca me agradaram. Não só isso. Apesar da eficiência garantida ele é impossível de ser realizado sem possuir horizontes limpos e muito menos ainda sem poder avistar estrelas que se encontrem próximas do equador celeste. Como é o caso da janela de meu apartamento.
            Assim depois de ler um interessante post do “Uncle Rod” me ocorreu a possibilidade de utilizar uma “Estrela Polar Austral”.
            Normalmente Sigma Octans leva essa honra. Mas depois de varias consultas ao Cartes du Ciel (CdC) e ao Stellarium ( ambos programas planetários disponíveis de forma gratuita na web) eu cheguei a brilhante conclusão que o titulo seria melhor empregado em uma ilustre desconhecida. Tycho 9521-302-1 ou HIP 71438. São a mesma pessoa...
            Ela nunca se encontra a mais de 12´ do polo sul celeste. E com magnitude visual de 6.8 ou 7.06 (dependendo do programa...)  se encontra dentro do alcance de minha buscadora. Mesmo em condições extremas de poluição luminosa já que estou morando em um canteiro de obra (cortesia de Eduardo Paes, o pior prefeito que conheci)  e os níveis de poluição luminosa ao redor de minha casa poderiam ser considerados insalubres.
            Desta forma resolvo fazer um reconhecimento da região junto ao polo com um pouco mais de poder de fogo que o apresentando pela minha buscadora. A escolha, obviamente, recai sobre meu Skymaster 15X70 mm. Sentado em minha poltrona eu escaneio a região e rapidamente localizo Sigma Orionis, HIP 112355 e a ilustre desconhecida já citada.  Duas estrela, ainda mais tênues, apontam para Xhi Octans e me garantem ser este o asterismo que estou realmente procurando.

            Contar vantagem é fácil. Quero ver contar a derrota.
            Em uma infeliz ideia acho que  a buscadora montada no telescópio e a cabeça toda “no esquadro”  bastará utilizar os parafusos para o ajuste da cabeça equatorial e alinhar tudo com a ilustre desconhecida. Afinal já vai tarde e eu gostaria de ainda fotografar Ngc 5617. 
            Depois de consultar “as cartas e os programas” calculo o pequeno desvio que deveria a cruzeta da buscadora apresentar da “Estrela Polar Austral”. E vamos lá. Afinal Ngc 5617 (outro ilustre desconhecido) fica a pouco mais de 1º de Alpha Centauro e não deve ser difícil de ser localizado.
            Escuto dentro de minha cabeça a musica de abertura dos “Trapalhões”. ( Ta-na-na-na-na-nammmmm-nam).
            Não avisto nada obvio pela buscadora. Credito ao Eduardo Paes e parto para a ocular. Com a 25 mm calçada no “Newton” (meu refletor 150 mm) fico passeando próximo a Alpha Cen e percebo tênues estrelas. Me parecem mais estrelas de campo que um verdadeiro aglomerado. Mas, em tese, ele deve estar dentro do campo visual. Ainda mais quando eu colocar a câmera. O campo dela é mais como uma 30 mm ( talvez  35 mm...) do que a 25 mm.  Faço uma foto e não percebo nada. Aliás procuro não perceber. O fracasso é eminente. Faço mais algumas exposições e começo a acreditar em geração espontânea. Meu mantra: “Quando eu empilhar vai surgir algo do nada...”
            Nem com reza forte, Photoshop e Rot n´Stack. A foto abaixo deixa claro que não só não fotografei Ngc 5617 como o telescópio se encontra totalmente descolimado e que o alinhamento polar está uma...

            Melhor deixar para lutar amanhã.
            No dia seguinte resolvo colimar o telescópio (é uma atividade para ser feita durante o dia) e mexe para lá mexe para cá e eu não fico satisfeito. Resolvo inventar e com as sobras de uma embalagem de ocular eu facão uma espécie de colimador. Apesar de “rudimentar” ele se prova bastante eficiente. E me mostra que o meu secundário só não esta mais fora do esquadro porque não dá... Depois de colocar o secundário nos eixos o primário é moleza.

            Passo a tarde estudando e aguardando escurecer para fazer mais uma experiência. Estive muito criativo esta semana. Provavelmente devido a lei seca que estou tentando estabelecer em solidariedade com a gravidez de minha mulher.

            Com a buscadora presa diretamente a cabeça equatorial eu mimetizo uma buscadora polar. E parto de novo na caça de HIP 71438. A ilustre desconhecida promovida a estrela polar...
            Com um pouco de paciência e com uma transparência duvidável eu me dou por satisfeito após alguns minutos de ajustes. Depois coloco o telescópio na cabeça, a buscadora no telescópio e alinho tudo. Quem disse que observar é maior moleza não sabe o que diz. Eu, em geral, suo a camisa.
            
           Hoje meu objetivo é outro. Criei antipatia por 5617 e resolvo buscar outro ilustre desconhecido. O relativamente obscuro aglomerado galáctico Ngc 5316. Também em Centauro e desta vez mais próximo, mas não tão próximo de Beta Cen.  Navegando pela buscadora não chego a perceber nada. Mas desconfio e parto para a ocular (25 mm). Percebo um grupo de estrelas e apesar de inseguro decido tratar-se de 5316.
            O nome deste post inclui “Uma comédia de Erros...”. Foi quase nome e sobrenome.
            A foto abaixo é de um asterismo que se localiza próximo de Ngc 5316. Mas evidentemente não é ele. Não é nem aglomerado. Em poucas pesquisas vejo a clara diferença entre os dois.

Se percebe claramente a poluição luminosa como um bafo cor "vapor de sódio"...

Asterismos são agrupamentos casuais de estrelas. Este em particular é uma descoberta de José Eustaquio do Nascimento e Islas. Se chama o “ Aglomerado do Pescador”.
            E isto é tão verdade quanto uma história de pescador.
            Vocês sabem qual é o único animal que cresce depois de morto?
O mapa abaixo apresenta exatamente o que a foto mostra acima. E liquida a fatura...

O "Aglomerado do Pescador"

            Mas nas derrotas, eventualmente, se aprende mais que nas vitórias. E podemos perceber que o alinhamento polar melhorou muito nas fotos do fictício asterismo descoberto pelo imaginário astrônomo. Assim como a colimação do telescópio.
            A ilustre desconhecida HIP 71438 foi promovida a “ Estrela Poalrar Austral”. Pelo menos aqui em casa...

P.S. Fiz algumas testes capturando imagens em RAW. Não funcionou. O Deep Sky Stacker apresentou umas fotos muito doidas e completamente fora dos padrôes. embora as imagens me parecessem normais quando as abri no computador. Após o empilhamento elas ficaram assim:

            Fiz dark frames em RAW também. Tentei vários settings e sempre este estranho resultado. Continuo sem entender... 
          De qualquer forma gostei da possibilidade de poder "bater o branco" nas fotos depois da captura através do "Digital Photo  Professional". E assim me livrar daquela cor " Vapor de Sódio". O recurso só é oferecido para fotos capturadas em RAW.   

sábado, 13 de abril de 2013

Ngc 6242 - Escondido na Multidão




Ngc 6242 é mais um daqueles injustiçados celestes. É um brilhante aglomerado aberto que estivesse em qualquer outro lugar seria sempre lembrado com uma maravilha galáctica.  Mas para seu azar ele se encontra muito próximo e ao mesmo tempo suficientemente distante de uma das mais dinâmicas áreas da região de Escorpião na via láctea. Na verdade a região da cauda de Escorpião e seu vizinho Sagitário são lar de mais tesouros que qualquer outra no céu.  A região especifica que onde se esconde 6242 é conhecida como a associação OB1 de Escorpião. Esta esparramada família de estrelas jovens marca a locação da gigantesca Região H-II no Braço Galáctico de Escorpião-Carina.

Esta área inclui maravilhas como Zeta1,2(z1,2) Scorpio e o objeto que mais se parece com um cometa (a olho nu) em todo o céu: Ngc 6231 sendo seu núcleo e Trumpler 24 sua cauda.
Pouco mais de 1º ao norte desta maravilha reside Ngc 6242.  Suficientemente distante para você elimina-lo da paisagem em prol das atrações mais proeminentes.
6242 é outra descoberta do Abbe Lacaille durante seu pioneiro levantamento telescópico do céu austral realizado entre 1751 e 52. Ele é a entrada de numero 10 da classe I de seus objetos. Lac I 10. Isto faria dele uma nebulosa sem estrelas. Fica claro como eram modestos os telescópios de Lacaille. Mesmo com meu binóculo 10X50 eu resolvo algumas estrelas no aglomerado. 
Lacaille mesmo diz: “... é possível que todos os objetos nesta classe (I) sejam débeis cometas. O tempo não me permite, em procurando pelo céu, retornar a todos os objetos e verificar se eles permanecem no mesmo lugar.”.

Como não tenho problemas com o tempo posso me deleitar calmamente com Ngc 6242.  Em um primeiro momento ele se apresenta como um esfuminho oval no qual os membros mais brilhantes pipocam facilmente com pouquíssimo esforço em meu 15X70 mm. Percebo algo como uma dúzia de estrelas empacotadas que residem sobre uma névoa de sóis mais distantes.


Utilizando o  “Newton” (meu refletor de 150 mm) e 40X de aumento ele se resolve quase completamente.  Seu núcleo apresenta a forma de um “x” e a leve nebulosidade restante se resolve como vidro moído com o uso de visão periférica. Com mais ampliação ele se resolve plenamente e conto cerca de 70 estrelas.
Uma brilhante estrela amarela se localiza ao sudeste do aglomerado. Ela não é membro do aglomerado e se encontra 1000 anos luz mais próxima que suas companheiras. O Aglomerado em si se encontra 2500 anos luz mais próximo de nós que os mais famosos 6231 e Trumpler 24 que formam o falso cometa e que residem, de fato, na associação OB1 de Escorpião. Mas todos eles habitam o braço interior ao nosso na Via Láctea.
Ngc 6242 é “apagado” em cerca de meia magnitude pela poeira interestelar. Isto é comum devido a se localizar próximo ao plano galáctico.  Assim podemos situar Ngc 6242 a 3600 anos luz do sol e calcular que ele possua 9,5 anos luz de ponta a ponta.

Apesar de eu contar quase 70 estrelas o aglomerado possui apenas cerca de 23 membros. Os outros são estrelas de fundo
A idade calculada do aglomerado é de 50 milhões de anos. O que pode ser considerado bem maduro para um aglomerado deste tipo. Suas estrelas mais maciças já tiveram tempo para tornarem-se supernovas deixando para trás apenas o modesto grupo que citei.
Um mistério ronda nosso convidado e refere-se ao conflito entre as observações dos pioneiros (e armados de telescópios bem mais poderosos que o Abbe...). John Herschel e James Dunlop.
Herschel em sua segunda observação, com um refletor de 450 mm, reporta uma estrela avermelhada de 8ª ou 9ª magnitude no centro do aglomerado.
Dunlop anteriormente (1826) descreve o aglomerado como muito comprimido em direção ao centro, mas não nota nenhuma cor.  
Na sua terceira observação Herschel aponta novamente uma estrela central, mas desta vez não fala em cor.
Mesmo fotos a cores recusam-se a mostrar cor nas estrelas centrais de 6242.
Mais interessante ainda é que nenhum dos dois se refere a evidente estrela amarelada no limite sudeste do aglomerado.
É claro que olhos diferentes veem cores diferentes. Mas o caso nunca foi bem explicado.
Mas como já foi dito olhos diferentes vêem cores diferentes e localizei diversas observações de astrônomos respeitados (Steve Coe, Luginbuhl and Skiff) que não percebem cor em nenhuma estrela . O´Meara percebe o mesmo tom amarelado que eu na estrela sudeste.
Visite este belo aglomerado e veja as suas cores... Ou a ausência delas.

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Astrofotografia em Familia





Semana Santa. A Lua ainda quase cheia...
Com meu irmão viajando a casa de Buzios vai estar vazia. E eu rapidamente começo a imaginar as possibilidades. Após um rápido dialogo estamos a caminho do posto avançado e dos céus mais escuros da Região dos Lagos. Mesmo com a lua cheia o céu em Geribá é muito mais generoso que o do Rio de Janeiro.
            Estamos dentro do carro eu, a cara-metade, minha filha, sogrinha e sogrão. Poderia dizer que será uma viagem “astronômico familiar”. E desta forma o “Newton” fica (um refletor 150 mm) e embarcam juntos “Galileo” (um reftator 70 mm) e meu binóculo 15X70 mm. Assim evito ter que amarrar o “Caixão de Newton” no teto do veiculo e mantenho a cara-metade na zona de conforto.
Ao contrario da previsão a estrada esta vazia e em pouco tempo chegamos ao destino. Depois de descarregar tudo começa o feriado.
Dizem que observação e “birita” não se misturam. É verdade. Mas também não devemos ser dogmáticos. Foi um encontro interessante o de meu binóculo 15X70 com uma garrafa de “Grants”. Depois de ter derrubado (com um grande auxilio de meu sogro) algo como metade da garrafa eu me encontro sozinho debaixo do céu. Este que se encontrava parcialmente nublado limpou na madrugada.
Saturno e planetas em geral não são grandes amigos de binóculos. Mas o Skymaster não faz feio. O planeta me faz lembrar Galileu, que descreve Saturno como se possuidor de orelhas. Percebo um disco acompanhado de alguns apêndices que recordam um formato discoide abaixo deste. Titã não se mostra. HIP 71469 e mais algumas estrelas de campo se apresentam emoldurando o Senhor dos Anéis. Faço um esboço no envelope de meu extrato bancario...
A coloração é bem mais amarelada...

Passeando pelo horizonte norte-nordeste eu me deparo com uma nebulosa bastante evidente. Mas aí começa a história de que álcool e observação não se misturam. O formato evidente era de uma nuvem. Ou eu estaria vendo  uma galáxia que depois de muitas pesquisas poderia ser Ngc 5812. Mas galáxias de 11ª magnitude não gostam de se apresentar para binóculos e muito menos em noite de lua cheia.
A madrugada ia avançada e eu me viro para o Sul. Já era bem tarde mesmo e eu começo a passear por campos que, em geral, se visitam mais a frente no ano. A fronteira Escorpião- Sagitário.
Pescar por essas águas é sempre sensacional. De binóculos então é sempre fartura. Nunca sei exatamente onde vou chegar.
Desta vez (e quase sempre...) começo por M7. Ele é um alvo binocular por excelência e começa o show. Se resolve em grande estilo.  Enche a rede e se não chega a transbordar é porque o 15x70 tem um campo de cerca de 3º. O “Aglomerado de Ptolomeu” não teme a Lua.
M6 é caminho obvio a partir daí. E o “Aglomerado da Borboleta” apresenta seu “shape” característico se resolvendo parcialmente. Adoro abertos que se resolvem parcialmente. As estrelas que não se resolvem dão um clima enevoado ao conjunto que é muito agradável ao olhar...
Eu sei que ao redor destes dois famosos aglomerados abertos habitam diversos outros menos populares. E assim fico escaneando pela região em busca de esfuminhos. Um me salta claramente aos olhos e se destaca da patuleia. É Ngc 6416. Um esfuminho grande e um pouco a oeste de M 6. Preciso me lembram de visita-lo com telescópio. Ele deve ser uma graça resolvido...
Depois é só seguir a Via Láctea. E diversos DSO´s se rendem ao 15X70 mm.
M8, M22, M21, M20 e diversos outros aglomerados (globulares e abertos) se apresentam. Uns mais discretos e outros menos. Esta região é sempre espetacular. E nem me dei ao trabalho de identificar cada um dos esfuminhos que compareceram a minha navegação etílica...
A ultima parada é um clássico: M11 “O aglomerado do Pato Selvagem”.  Finalmente sou vencido pelo cansaço e pelo goró.  Me retiro.
Já na sexta feira vai entardecendo e o céu se apresenta "empedrado” Não chega a ser inspirador ainda que permita algumas fotos de caráter mais artístico que astronômico...
De qualquer forma percebo que o horizonte sul vai se tornando mais claro e menos “empedrado”. E assim coloco o “Galileo” na montagem EQ 3-2 que se revela muito mais sólida com ele que com o meu telescópio maior (o que é obvio...). E preparo também a câmera em seu tripé. Com a família reunida eu não via me dedicando plenamente a “Arte Difícil”. E assim preparo-me para realizar algumas fotos de campos estelares e de constelações. E de quebra observar alguns “blockbusters” pelo “Galileo”.
Fiz um alinhamento polar seguindo mais os instintos que propriamente o bom senso.
Não sou um cara com paciência para o método do “drift”. E assim, em geral, utilizo Sigma Octans como minha guia. Deixo o telescópio e a montagem o mais no esquadro possível e utilizando a própria buscadora do telescópio alinho o conjunto. Centralizo Sigma na Buscadora e depois dou um pulinho para lá e dois para cá e voilá.  Às vezes fica melhor às vezes pior. Mas em todo caso estou com um setup que vai me permitir exposições entre 15 e 30 segundos sem muitos rabiscos no produto final. E não levo mais que 15 minutos para tal. Acho que nunca publicarei fotos na Galeria dos Leitores da Astronomy.
Faço varias fotos do Cruzeiro do Sul com a câmera no tripé. E depois do campo próximo a Alpha e Beta Centauros.  Por fim faço uma exposição da região onde reside Omega Centauro. Todas utilizando minha 75-300 mm @ 75 mm .
Fazer fotos desta forma é bem divertido e com a 70 mm consigo fazer exposições de até 20 segundos mantendo o rastro das estrelas aceitáveis.
Meu sogro fica curioso sobre o que estou fazendo. E porque de tantas exposições aparentemente idênticas. Eu explico que em astrofotografia as fotos , embora digitais, te que ser submetidas a “revelação”. E que estas serão  “empilhadas” e assim obterei mais detalhes.Ele parece não entender. Ou não dar a mínima. Ou os dois.
Ainda bem que não falei na tal  “razão sinal-ruido”...
. Na foto do Cruzeiro consigo perceber diversas estruturas. Ngc 4755 é evidente abaixo da Mimosa (Beta Crux). Logo acima de Acrux percebe-se claramente Ngc 4349. No canto da foto 3766 é claro. E se prestando atenção diversos outros DSO´s se escondem na paisagem. O Saco de Carvão é que não se apresenta.
Outro detalhe interessante nesta foto (na verdade fotos) é que elas foram “reveladas” de formas distintas. Em ambos os casos foram  empilhadas 15 fotos de 20 segundos de exposição (as mesmas fotos...). A diferença é o software utilizado. Na primeira foi utilizado o Deep Sky Stacker.. Este, em tese e também na pratica, mais poderoso que o Rot n´Stack. Mas novamente percebo que o RnS preserva melhor as cores. O DSS parece gerar uma imagem em escala de cinza. A Rubiácea (Gama Crux) é um excelente exemplo desta diferença. Repare nas fotos.
Deep Sky Stacker                                                                           Rot n´Stack

Omega Centauro se apresenta claramente em uma única exposição de 20 segundos com a zoom @80 mm.


Depois disto apresento a “Caixa de Joias” (Ngc 4755) para o sogrão com 52X de aumento: - Incrivel. Um triangulo perfeito!
 E rapidamente retorna para a garrafa de “Grants”.

Como já estou brincando de astrofotografia com minha "zoom barata" faço algumas fotos da região de Alpha e Beta Centauro.Com atenção e boa vontade você vai perceber Ngc 5662, 5316 e 5281. Todos aglomerados abertos discretos e entre 5a e 6a Magnitude. Vai perceber também que entrou luz pela lente adentro...

Logo resolvo tentar a sorte com meu alinhamento polar tabajara e faço algumas exposições de Omega Centauro através do “Galileu”. Ele definitivamente poderia estar melhor. Mas Omega é um gigante e é sempre um bom modelo. Uma dica: sempre que você conseguir perceber as Letras C e H impressa por sobre e em meio ao Gigante é porque o alinhamento polar não estava lá essas coisas. Já percebi isto em diversas fotos. Minha e de outros... Nas fotos individuais o efeito é claro. Na empilhada o erro se disfarça. Definitivamente o “Newton” tem mais poder de fogo e melhor qualidade que meu pequeno refrator.
Uma  exposição ( o efeito descrito não é claro devido a compressão do Blogger)
Muito semelhante ao que se vê na buscadora e em binóculos. A lua ainda vai bem cheia...

15 exp. de 25 seg. Rot n´´ Stack. É mais uma licençaa poética que um registro...

Depois disto não poderia deixar de fazer algumas fotos da lua. É fácil e sempre ficam bonitas. Desta vez as nuvens ainda brincavam e consegui diversos efeitos de luz e sombra por sobre a superfície lunar.





Depois disto me rendi novamente aos chamados de Baco e abri uma cerveja. E depois outra. E depois o “Grants”...
Já mais do lado ébrio da vida fiz algumas fotos da região que tinha visitado na madrugada da véspera (Sagitário-Escorpião) e com o céu “empedrado” consegui alguns resultados senão bons pelo menos diferentes. ( A compressão do Blogger novamente atrapaha um "pouco")

Sabadão choveu a cântaros...
Astronomia não tem que ser um fim em si mesmo. E tem de ser divertida. E desta forma o foi. Em um passeio com a família eu não poderia deixar a minha fixação dominar o ambiente e me tornar um cara antissocial. Um péssimo habito é querer manter todos no escuro. Mas mesmo sem realizar a operação “by the book” é possível obter resultados bastante interessantes e ainda apresentar a pratica astronômica a quem não é e nem deseja ser do ramo.
No domingo já nos preparávamos para entrar no carro. Sogrão e Sogrinha na maior água e o céu de repente abre. Não sei o que vejo. Depois descubro... faço uma rápida série de fotos do que deve ser o campo ao redor de Procyon. De novo com a 75-300 @ 75 mm. Não é exatamente um espetáculo. Com o Logaritmo do modo sort no Rot n´Stack ( já disse em algum lugar que este modo foi feito ou pelo Wharol ou pelo Miró) aparece algo no mínimo “estelar"...


Astrofotografia em familia...