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segunda-feira, 7 de março de 2016

Ngc 6752 e 6397: Os Globulares Marinhos

           
         

      O mês de fevereiro foi bastante intenso . Fui escalado para realizar um projeto na paradísica Fernando de Noronha.E minha esposa foi demitida.  Mesmo com todas as preocupações associadas ao trabalho em questão e a preocupação com o saldo bancário da cara metade  minha maior fantasia era sobre os céus escuros que poderia encontrar na ilha. Sabendo que cada quilograma de bagagem contaria para o transporte do equipamento necessário para  filmagem eu ainda assim consegui contrabandear meu "Pau de Dar em Doido" ( um binóculo 15X70) e Hipátia ( minha montagem EQ3-2) para trabalhar em conjunto com uma lente 70-300 mm.
                O céus são de fato muito escuros e em certas noites realizei sensacionais passeios com o " Pau de Dar em Doido". Mesmo que lutando contra um céu a "la Hermes de Aquino" ( Nuvem Passageira...)  eu tive visões incríveis da Plêiades , Híades e de diversos abertos em Auriga , Touro e etc... Uma noite foi especialmente recompensante deitado nas areias da Praia do Boldró . Percebi diversas galaxias no aglomerado de Virgem. Mas realizar longas exposições eram uma tarefa bem ingrata e a alternância de momentos de céu claro com chuva tornaram quase impossível a realização de astrofotografia. A única noite que me dispus a colocar Hipátia em campo terminou em correria para salvar todo o equipamento da chuva.
                O arquipélago é  um habitat diurno. Uma das maiores maravilhas astronômicas que você vai ver  é de caráter muito cotidiano. Diariamente eu via o por do sol. No ultimo dia me lembrei que gostava de escalar e em um ato de determinação escalei o "Piquinho" para observar este evento. Ainda nesta noite fiz algumas das poucas fotos astronômicas da viagem. Hipátia foi até Noronha a passeio.


                
                


                Como me disseram os locais oitenta por cento das maravilhas do arquipélago estão debaixo da água...








                De volta a "Stonehenge dos Pobres" eu , já saudoso de DSO´s e ainda sobre os efeitos da viagem, resolvi capturar dois globulares que pela forma  tem forte relação com o ambiente marinho.
                O primeiro deles é Ngc 6752 . Este foi apelidado por O´Meara como o aglomerado "Estrela do Mar".   Sua observação visual definitivamente justifica o apelido e em minha modesta foto realizada com forte poluição luminosa e com pouco tempo de captura o efeito permanece. Em registros mais "sérios" esta impressão se perde um pouco.  
                Localizado na constelação de Pavão  ( que é a encarnação celestial de Argo, o construtor do navio dos Argonautas) esta estrela do mar é o quinto globular mais brilhante dos céus e também um dos mais fáceis de ser resolver em estrelas individuais . Nem tanto devido a sua concentração ( que é bem alta) mas devido a sua proximidade de nós e a a magnitude de ramo horizontal (13,7) . Devido a isto tudo  Ngc 6752 é um dos globulares que sofreu colapso do núcleo mais estudados e que nos deu uma grande compreensão dos fenômenos envolvidos neste processo e de das estruturas geradas da evolução dos globulares em geral. Assim  sabemos que no núcleo interno deste de 20 a 40% de suas estrelas são binarias . Também foram encontradas diversas "blue stragglers"  e pulsares de raio X.
                Ngc 6752 se apresenta evidente em meu 10X50 e chega a começar a se resolver em suas bordas com o 15X70. Mesmo no Rio .
                Quando observado com o "Newton" ( refletor 1500 mm f8) ele apresenta seu caráter marinho claramente e justifica seu apelido. 


                

              Foi descoberto por Dunlop durante seu levantamento realizado em Parammata , na Austrália, em 1827. É a entrada de numero 259 de seu catalogo. Ele o descreveu assim:
"[Uma nebulosa bem grande e brilhante, com 5´ou 6´ de diâmetro. Uma figura arredondada e irregular e facilmente resolvida em um aglomerado de pequenas estrelas. Extremamente comprimida no centro ; A parte brilhante no centro é causada por estrela de magnitude considerável quando comparadas com outras na nebulosa. Me sinto inclinado a crer que se tratam de dois aglomerados alinhados ; a parte brilhante esta um pouco ao sul do centro da grande nebulosa"

                Com magnitude 5,4 ele chega a ser percebido a olho nu em locais bem escuros.  Partindo-se de Peackock ( Alfa Pavo) em direção a cauda do Pavão ele será facilmente localizado com auxilio de qualquer buscadora óptica mesmo em céus urbanos.  É um globular que merce mais destaque e que devido a sua posição muito austral é pouco comentado .Juntamente com nosso próximo convidado ele compõem bem com a sagrada trindade composta por Omega Centauro, Tucana 47 e M22.            Continuando em busca de globulares com algum "caráter marítimo" eu acabo visitando um dos poucos objetos do catalogo Lacaille que ainda não apresentei por aqui. Nossa próxima parada é em Ara e naquele que pode ser o aglomerado globular mais próximo de nossa casa. Ngc 6397.  Este foi apelidado por mim mesmo. Suas estrelas , com o auxilio luxuoso de meia garrafa de um espirito das highlands escocesas , me levaram a ver um cefalópode mutante . Um polvo com nove pernas. Daí para o lúdico exercício de batizar coisas muito maiores que as nossas estruturas cotidianas como algo que as "humanize" foi um passo . Nasceu o "Aglomerado do Polvo Mutante".  Com certeza bem maior e assustador que o pequeno exemplar que encontrei entocado e apavorado na Baia de Sueste...



                Ele forma um belo par com o aglomerado anterior e é também um dos 20 aglomerados globulares que sofreram colapso de seu núcleo e assim possuem uma imensa concentração de estrelas em pouco espaço. Algo  sempre interessante para a astrofísica ...

                Como falei ele pode ser o aglomerado mais próximo da terra. Atualmente as bolsas de aposta na Inglaterra pagam mais para ele do que para M4 . Mas a incerteza ainda admite reviravoltas e jogar no azarão as vezes compensa...  Sua distancia é estimada em 7200 anos luz de nós e  a de M4 é de 6.800.  Com magnitude 5.3 é um desafio para ser observado a olho nu em céus nem tão escuros . Estando perto de  Beta Ara ele é facilmente localizado com o uso de qualquer buscadora óptica.




                 
                 6752 ele se apresenta facilmente em meu 10X70 e começa a querer resolver-se em sua bordas . Resolvem-se varias estrelas com o uso do "Newton" e mesmo do "Galileo" ( um refrator 70 mm) .


                Ngc 6397 é o quarto Globular mais brilhante dos céus perdendo apenas para a já citada Trindade. E deixa no chinelo os tão cantados M 13 e M15...
                               O aglomerado cobre uma área significativa ( 0,5o) mas o que se percebe mais claramente é seu núcleo super denso. Afinal sofreu um colapso...
                Ele foi listado pôr Lacaille  em  1755 como a entrada de numero 11 da categoria III  de seu catalogo de Nebulosas ( estrelas acompanhadas de nebulosidade) ; Em sua tradicional síntese ele não diz mais nada... Cabe a Dunlop revelar sua natureza de forma um pouco mais expansiva: "  Nebulosa resolvida em estrelas.". É a entrada 336 de seu catalogo.
                É um outro favorito e mesmo sóbrio percebo seu aspecto cefalópode. ´Beta e Gama Ara formam uma bela e colorida dupla no caminho para o "Polvo Mutante " e este é um passeio que gosto muito de fazer.
                As fotos de Ngc 6397 foram realizadas em Búzios. São resultado de algumas dezenas de exposições de 20 segundos com o "Newton" e com uma Canon T3 . 1600 ASA. O Rascunho de polvo foi feito com o Photoshop. O empilhamento foi feito no DSS.
                Saudades de Noronha. Reza a lenda que o tempo é mais firme em setembro...


                P.S. Não fui  a nenhum ato contra a Dilma. Mas agora irei. Sinto que o contracheque da cara metade ( que não chega mais...) vai atrapalhar meus planos para fotografar o aglomerado de Virgem este mês.  

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