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terça-feira, 1 de agosto de 2017

M 71: Um Globular "Aberto"

        

       M 71 é um dos globulares Messier menos densos. Dependendo da fonte ele é um globular classe X (escala Shapley). E assim mais denso que M 55. Em outras fontes ambos dividem a classe XI. Da mesma forma que M 55 sua aparência recorda em muito aglomerados abertos extremamente densos com M 11 ou Ngc 2477. Quando comparo sua imagem com estes me inclino mais para a classe X. Cada um com seu cada um. M 71 e M55 não poderiam ser visualmente mais diferentes do que são. 
            Na verdade, sua classificação como aglomerado globular é controversa.  O próprio Shapley o classificou como um aglomerado do tipo “g” (sua categoria para abertos superdensos). Shapley criou escalas tanto para aglomerados globulares como para abertos. A dúvida se arrastou por várias décadas.
            Em 1943 James Cuffey, do Observatório Kirkwood, chegou à conclusão que este pendia mais par um frouxo aglomerado globular. Posteriormente, em 1959, o mesmo Cuffey obteve um diagrama de Cor-magnitude que retornou M 71 para a seara dos abertos.
            Atualmente M 71 é considerado novamente um globular. Mas um “todo estranho”. Sua metalicidade é extremamente elevada (17% dos elementos pesados presentes no sol). Não possui nenhuma variável do tipo RR Lyrae, que são típicas de globs e não bastasse isto tem uma velocidade radial que embora controversa é muito baixa. E ainda por cima possui uma estrela, Z Sagittae, que é uma das poucas gigantes do tipo M conhecida. Até o momento existem apenas mais 5...
            Só por isto ele já seria um alvo de grande interesse. Mas tem mais. Ele é extremamente jovem para um glob.   Com apenas 9 ou 10 bilhões de anos.
            Com a evolução do nosso conhecimento das estruturas estelares no universo o modelo paleolítico de que globulares se formaram nos primórdios do universo e são habitantes exclusivos do halo das galáxias se tornou um pouco duvidoso. Hoje acha-se que a maior parte destes se formou naqueles tempos. Mas acredita-se que imensos aglomerados abertos muito jovens podem vir a tornar-se estruturas semelhante a globulares no futuro. O aglomerado que habita o coração da Nebulosa da Tarântula na Grande Nuvem de Magalhães e Westerlund 2 na nossa galáxia são candidatos ao processo.  M 71 é uma espécie de elo intermediário.

            M 71 é facilmente localizável. Ele habita no centro da linha que liga Gamma Sagittae e Delta Sagittae na discreta, porém obvia constelação de Sagitta. Esta é perceptível mesmo em céus suburbanos encravada no famoso “Triangulo de Verão” (aqui de inverno.Quase primaveril.) que é formado pelas Brilhantes estrelas, Deneb, Vega e Altair.
            Pela buscadora ele é pouco mais que um esfuminho e não o considero um alvo fácil binocular. Diversos autores o consideram obvio. Céus escuros devem ajudar muito neste caso. Como é um aglomerado pouco denso seu brilho de superfície é baixo e seu núcleo é a única parte que percebo claramente com minha buscadora 8X50 mm. Utilizando um refrator de 70 mm não chego a resolver estrelas. Mesmo com o “Newton” (150 mm f8) é necessário o uso de visão periférica. Embora não o tenha observado alto no céu e o horizonte norte me ser desvantajoso.
            M 71 é uma descoberta de Philippe Lois de Chéseaux em 1746. Mas com seu trabalho levantamento de nebulosa não foi publicado até o trabalho de Bigourdan o tenha feito público em 1892 o objeto foi redescoberto de forma independente por Johann Gottfried Koehler em algum momento entre 1772 e 1779, em 28 de junho de 1780 por Méchain (“sócio de Messier) e finalmente observado por Messier em 4 de outubro de 1780.
            A descrição de Chéseaux é bastante completa e interessante: “ Finalmente uma outra nebulosa que nunca foi observada anteriormente. É de uma forma completamente diferente das outras. Tema forma perfeita de um raio, ou de uma cauda de cometa. Com 7´ de comprimento com 2´ de largura. Seus lados são exatamente paralelos assim como seus dois extremos. O centro é mais esbranquiçado que as bordas...”
            Messier por sua vez diz: ” Nebulosa descoberta por Méchain em 28 de junho 1780, entre Gamma e Delta Sagittae ... Sua luz é bem fraca e não contém nenhuma estrela. Qualquer luz a faz desaparecer ...”  Sua descrição me leva a crer que ele não tenha utilizado seu melhor telescópio na observação (Um Dollond 90 mm).

            A ciência (de fato) tem uma qualidade fundamental. Um dogma que é o contrário do dogma. Ela não é estática. Suas verdades podem mudar. Seja por observações, experimentos, tecnologia e/ou todos acima e mais alguns... A definição de aglomerados globulares está em constante evolução. Bem como o que se supõe serem suas origens. Atualmente sabe-se (ou achamos saber) que diferentes globulares podem ter histórias cosmológicas distintas. O que os separa de galáxias destripadas ou de abertos vai variar de globular para globular. Parâmetros são parâmetros e só.
            M 71 é um excelente exemplo disto. Mesmo hoje ainda cabe uma dúvida (o motor da ciência) se este se encaixa melhor em um aberto denso e antigo ou em um globular frouxo e jovem. Diversos parâmetros indicam para um lado. E outros para o outro. Embora minha opinião não importe em nada (opiniões não fazem parte da ciência) eu acredito que trate-se de um Globular. Burnham no seu mais que clássico “Celestial Handbook” toma uma acertada decisão, quando o apresenta na tabela que inicia a apresentação dos diversos objetos que ele considera cosmologicamente significativos em cada constelação, de dizer que M 71 não possui uma classificação definida. (Class not Certain). Seu livro é de 1978.
Burnham Celestial Handbook.

            Ele  nos diz que “M 71 é um daqueles incomuns aglomerados cuja a classificação é alvo de dúvida”. Levanta ainda a dúvida se este foi, de fato, observado por Chéseaux e nos diz que a primeira observação deste é provavelmente a realizada por Koheler.
            Coube (como quase sempre) a Herschel resolver o aglomerado em estrelas.  “Muito grande... um rico aglomerado, com estrelas de 11... 16a  magnitude.
            Caminha a ciência e Stoyan em seu também clássico “Atlas of the Messier Objects” (2008) assina ‘ Aglomerado globular”. E associa algumas características deste não só a M 68 (um frouxo globular “strictu sensu”) como também a Ngc 104 (Tuc 47). Curiosamente M 104 é muito mais denso e poderia ter como origem uma galáxia destripada. E espertamente nos diz que o objeto embora seja considerado atualmente um globular bonne fide é ainda alvo de alguma discussão.
            M 71 foi um dos globulares Messier que mais resistiram a minhas investidas. Diversas vezes fracassei em sua busca. Embora , teoricamente, seja um fácil “Starhoop”. É , sem dúvida, um DSO digno de nota e visita.
            Em céus poluídos é um alvo que considero difícil e por isto mesmo alvo digno de caça.
2 X Drizzle no DSS + Gradiente no PixInsight+ Photoshop CS 6

            Suas fotos revelam muito mais que o que observo na ocular. A que abre este post foi resultado de 19 frames com 30 segundos de exposição utilizando ASA 1600.  A foto acima é resultado da mesma captura. A câmera utilizada foi uma Canon T3 sem modificação e o Telescópio foi o Newton (refletor 150 mm f8) montado sobre Mlle Herschel. (Uma equatorial HEQ 5 pro).

            Um globular “aberto”...

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