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sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

M 45: As Plêiades Reloaded

             
                     É evidente que já falei da Plêiades aqui no Nuncius Australis. É, provavelmente, o aglomerado aberto mais famoso do todo o firmamento. No post anterior foram apresentadas a diversas das lendas que surgiram da observação desta maravilha celestial e que encantaram quase todas as civilizações que já caminharam sobre a terra. Qualquer um que já tenha percebido o conjunto que habita na constelação de Touro não terá dificuldade para entender o porque de tanta fascinação. Eu sei que não será a última vez que falarei delas por aqui.
                Mas como o post anterior aconteceu em tempos imemoriais e minha biblioteca cresceu bastante desde então resolvi que seria de bom tom apresentar a opinião de autores mais recentes que os historiadores da Babilônia, da Grécia clássica, da China dos vasos Ming e etc...

Esticadas no PI...

                Mas antes disto preciso, em uma crise ufanista, apresentar uma lenda faltante. Justamente o registro das Plêiades pelos habitantes originais do Brasil.
                A constelação do Homem Velho (Tuya em tupi) é composta de três sub-constelações. Uma delas é M 45.  (As outra são as Hiades e as “Três Marias”). O Velho engloba em si estrelas pertencentes as constelações de Touro e Orion e Eridanus.
                Nossas convidadas são chamadas de Eixu. O Ninho de Abelha ou Vespeiro. Bem apropriado para aqueles, que com a vista apurada, como o nosso legendário cacique Aporema (Patrono e sócio do Nuncius Australis) conseguem resolver mais de 7 estrelas no aglomerado.
Como em diversas das antigas civilizações as Plêiades têm papel importante no calendário das etnias indígenas tanto no Sul como no Norte do Brasil. Seu nascer helíaco marca o início do ano e os Tupinambás o conheciam muito bem. Segundo d´Abbeville eles afirmavam que as chuvas iam chegar. Como a meteorologia na época era ainda mais incerta que atualmente eles sempre acertavam. Podia demorar um pouco mais ou um pouco menos, mas as chuvas acabavam chegando. E como Eixu aparecia antes das chuvas e desaparecia no fim para retornar em igual época, eles reconheciam o intervalo de tempo decorrido entre um ano e outro com relativa precisão.
Sem drizzle. Gradiente "removido" no Fitswork. Pouquíssimo pós. processamento.

                Tendo ratificado esta injustiça com nossos antepassados mais próximos posso dizer que este post vai ter um caráter astrofotogáfico mais completo. Afinal assim como minha biblioteca meu equipamento fotográfico também cresceu.  E se no primeiro consegui obter um esboço da nebulosa que parece envelopar nossas estrelas desta vez o registro foi bem melhor. Vejam que falei “melhor”. Nunca serei um bom astro fotógrafo. É uma arte que demanda muito capricho e como já ganho meu pão às custas de fotografia dificilmente quero investir o suor do meu rosto nos meus momentos de lazer. E assim astrofotografia para mim é a melhor diversão.  Embora existam diversos objetivos fotográficos que me são auto impostos e que parecem me inspirar e obrigar a capturas mais caprichadas do que a média. Foi assim com a “Cabeça de Cavalo”, M45 e espero ainda este ano conseguir registrar tanto a Roseta como pelo menos um pedaço da Nebulosa do Véu.  No mais geralmente a qualidade por mim imposta é a do “Projeto tudo que Existe”. Neste pretendo observar (o que for possível) e fotografar até o que não conseguir observar visualmente dos DSO´s listados por Dreyer no New General Catalog (todas os aglomerados, nebulosas e galáxias registradas até 1888). Mas sem nenhuma pretensão artística. Registrou e é possível diferenciar de um carro passando em alta velocidade esta valendo. Eu tinha por princípio só fotografar o que eu conseguisse perceber (ainda que de forma tímida) visualmente. Mas vendi minha alma na encruzilhada e atualmente me conformei que certos DSO´s só se entregarão para o Newton (meu refletor 150 mm f8) com auxílio de um sensor digital em vez de minha velha retina...
                E pulando alguns milênios de história desde o post anterior vamos ver o que Messier, autor do mais famoso e um dos primeiros catálogos clássicos (e ainda antes da revolução francesa), tem a nos dizer. É importante lembrar que as Plêiades ganharam seu nome mais atual graças a ele. M 45. Ou Messier 45.
                “Aglomerado de estrelas conhecido como as Plêiades. A posição dada é da estrela Alcyone”
2 Drizzle e Luminancia do DSS.



                Seguindo a cronologia de minha biblioteca vamos ver o que Smith nos conta no Volume II do “Cycles of Celestial Objects “(The Bedford Catalogue, 1881). Curiosamente este não apresenta uma entrada exclusiva para M 45. Mas ele dedica varias páginas a história ao redor destas em sua entrada sobre Alcyone. Na verdade, diversas das estrelas principais (as sete irmãs) tem entradas individuais em seu guia.  Ele ressalta que as “Plêiades são um celebrado grupo de estrelas, ou uma mini constelação, no ombro (?) de Touro.” E apresenta todos os nomes como estas são popularmente conhecidas pelos diversos europeus.
                A seguir teremos o Rev. Webb. Este logo na abertura de sua apresentação sobre a constelação de Touro em seu magnifico “Celestial Objeccts for a Common Telescopes” (1893) nos diz que esta é marcada grupos lindos e familiares de estrela. São estes as Hyades e as Plêiades. Mas destaca que nenhum dos dois agrupamentos é concentrado o suficiente para faze-los bons alvos telescópicos exceto com grandes campos. Ainda nos diz que 6 de suas estrelas são facilmente percebidas. E conta que Kepler (antes do telescópio) teria contado 14 estrelas e localizado com admirável precisão 11 destas.  Conta também que Von Littrow fala em 16 estrelas e garante que 11 destas são percebidas frequentemente.
                Dando um pulo temporal de mais de um século estes valores parecem concordar com as observações descritas por O´Meara em seu “Deep Sky Companion: The Messier Objects” (1998).
                Nenhum destes guias mais antigos fala na Nebulosidade que envolve o aglomerado e que é bastante evidente em volta de Merope. Isto serve para botar lenha na fogueira sobre a discussão se a nebulosidade em torno das Plêiades perceptível a olho nu. Mas Scot Houston (que escreveu a coluna Deep sky Wonders por décadas) garante que este feito não só é factível como tarefa simples... Tennynson em seu famoso poema Locksley Hall parece ter a mesma opinião já que fala em uma “trança prateada” ("Many a night from yonder ivied casement, ere I went to rest, /Did I look on great Orion, sloping slowly to the west. /Many a night I saw the Pleiads, rising thro' the mellow shade, / Glitter like a swarm of fireflies tangled in a silver braid.")  Eu com meu astigmatismo e sem óculos percebo só nebulosidade... Estrelas que é bom quando muito 4. Com os óculos chego ao conservador valor de 6.

1 exposição 30 seg.

                Mas a razão deste post é contar como consegui fotografar a Nebulosidade que envolve o aglomerado. Então vamos visitar o meu Guia observacional favorito. The Burnham´s Celestial Handbook” (1978). O Volume 3 para ser mais exato.
                Burnham dedica 21 paginas de seu tratado com M 45 e é o primeiro dos guias observacionais que possuo que aborda especificamente a nebulosa ou nebulosas em torno das Plêiades.  Em debate recente em um grupo de Astronomia! que participo em uma mídia social e que teve suas origens no pré-histórico ORKUT chegamos a conclusão que esta é a nebulosa mais próxima da terra. Embora seja discutível se esta é realmente associada as estrelas do aglomerado ou apenas uma nebulosa de primeiro plano ela ainda assim será muito mais próxima (400 anos luz) que M 42 (1500 AL) ...  Atualmente a nebulosa é por muitos considerada um alinhamento casual e a velocidade radial da nebulosa e das estrelas parece corroborar a tese. Mas há controvérsias. E imagens falam muito e o que se observa parece só permitir que não haja nenhuma relação entre a nebulosa e as Plêiades em si em uma grande armadilha das leis fundamentais do universo.
                Burnham acredita que estas são relacionadas. Lá pela 15 ou 16 pagina de sua apresentação ele cria um tópico específica para falar da nebulosidade envolvida. Ele começa chamando atenção para o fato do “aglomerado inteiro ser envelopado em uma tênue e difusa nebulosidade de uma grande extensão (a trança prateada de Tennynson) que parece brilhar por uma luz refletida. Esta nuvem cósmica pode ser elusiva visualmente apresenta muito detalhes peculiares com fotografias de longa exposição”. Fico muito feliz em perceber que minhas fotos não chegam a deixar muito a desejar quando comparadas com uma foto por ele apresentada como impressionante e feita com o astrográfo de 13 polegadas do Observatório Lowell. Na verdade, das fotos apresentadas no Handbook, a única que realmente deixa minhas experiências com mais de uma volta atrás foi feita pelo telescópio de 100 polegadas do Monte Palomar.  Em defesa da tese que a nebulosidade e o aglomerado são companheiro de fato ele apresenta que Slipher, em 1912, obteve espectros idênticos para a nebulosidade e para as estrelas do aglomerado.  
3 drizzle + Fitswork+ Photoshop. 

                Burnham ainda nos conta que a porção mais brilhante da nebulosidade envelopa a estrela Merope e se estende por cerca de 20´para o sul; ela foi primeiramente percebida por Tempel com um refrator de 100 mm observando de Venice em 19 de outubro de 1859 (portanto antes de Smith escrever seu livro.) Ele descreve esta como o efeito de ”um bafo sobre um espelho”. Lewis Swift também a achou detectável com um modesto telescópio de 50 mm com 25X. T.W. Backhouse confirmou sua realidade com um refrator de 114 mm,” ainda que para percebe-la tivesse que manter Merope fora de campo”. Por outro lado S.W. Burnham não achou nem sinal desta com o grande (18 polegadas) refrator Dearborn em Illinois. Desta forma a nebulosa foi considerada variável por um curto período. Com o advento da fotografia esta hipótese foi descartada e desde seu primeiro registro fotográfico (Paul and Prosper Henry, Paris 1885) nada parece ter mudado. Agnes Clerk, uma de minhas autoras favoritas e um dos motores da divulgação cientifica no início do século passado nos fala de uma impressão de que “as massas das nebulosas em vários instantes, parecem se estivessem sendo puxadas para fora da forma e sendo atraídas para guirlandas pela atração das estrelas vizinhas...”
                Depois de muito pesquisar achei que deveria me preparar para fotografar as Plêiades a contento. Ha alguns anos tinha feito uma foto onde se ensaiei perceber a nebulosidade, mas confesso que não ficara completamente satisfeito. A impressão que me dava é que a lente estava um pouco embaçada e não havia, de fato, o efeito e o registro desejado.
                Seguindo o conselho do Reverendo Webb e sabendo que o alvo é muito grande para o campo de meu telescópio escolho como arma mina zoom 75- 300 mm @ 300 mm f 5.6; assim garantiria cobrir todo o campo e ainda assim ter ampliação suficiente para com o recurso de drizzle oferecido conseguir destacar bem a nebulosa. Outro fator é que com apenas 300 mm o acompanhamento fica mais generoso e mesmo um alinhamento polar abaixo do perfeito consegue ser menos miserável para as fotos finais. Fotografando de Friburgo e sempre com pouco tempo as vezes as coisas têm que ser feitas com dá e não como deveriam ser feitas...
                Realizei 80 exposições de 30 segundos cada com ISSO 1600. Posteriormente reduzi estas a 71 apenas descartando as piores. Canon T3 montada em pigback em uma cabeça HEQ 5 pro. Sem darks, Flats ou Bias frames.
                As fotos foram empilhadas utilizando o Deep Sky Stacker. A primeira versão foi realizada sem drizzle. Ao sair do DSS percebi que havia capturado boa parte da nebulosidade embora a imagem não apresentasse a ampliação necessária para destaca-la. Ainda seria necessário também aplicar diversos processos no Photoshop para conseguir realçar a nebulosidade.  As imagens foram capturadas em RAW e o DSS me gera um arquivo TIFF. Acho que as imagens estão bastante cinzentas. Quase em escala de cinza. Como vou realizar vários tratamentos deixo a matriz assim e no Photoshop dou uma puxada no azul que costuma caracterizar as fotos da Plêiades e que são característica de suas nebulosidades. Não sei até que ponto isto é resultado do pós-processamento utilizado. Nas fotos do Celestial Handbook as coisas são P&B.
                Nas diversas imagens aqui apresentadas apresento o tratamento a que cada uma foi submetida nas  legendas abaio das mesmas.


                Como as Plêiades habitam muito próximas da eclíptica um sonho que tenho é fotografa-las de novo durante uma ocultação planetária.  Como disse no começo eu devo falar de M 45 de novo...
                   Por fim uma curiosidade: M 45 não possui numero Ngc. Nem IC. Mas a nebulosas em torno de Merope e  Maia possuem entradas no New General Catalog ( Ngc) . São Ngc 1435 e 1432 respectivamente. 

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